segunda-feira, 17 de junho de 2013

Escalas Cromáticas (Leonardo da Vinci), O Pansamento Plástico ( Mário Guerreiro), Nomes (Manuel Antônio de Almeida)






Escalas cromáticas, quantidades.

            Para Leonardo são seis as cores simples, muito embora, diz
ele, os filósofos não considerem nem o branco e nem o preto como
cores, pois segundo eles, uma é a totalidade delas e outra a ausência.
As cores simples, então, segundo Leonardo, são seis e obedecem
a uma ordem: a primeira, o branco para as luzes; a segunda, o
amarelo; a terceira, o verde; a quarta, o azul; a quinta, o vermelho;
e a sexta, o preto para as sombras. Fala assim de uma passagem
gradativa, com uma ordem, entre um claro e um escuro passando
por valores cromáticos.

            Nas passagens dos diversos intervalos há uma relação que é
sempre a mesma. Somos levados a pensar quantitativamente, na
medida em que se estabelece uma noção de ritmo baseado em uma
recorrência pressentida. Em uma escala com seis intervalos temos
que o primeiro é mais claro que o segundo, na mesma medida em
que o segundo é mais claro que o terceiro, etc.

            Se considerarmos as cores concretas adjetivas, e também
livres do poder das palavras, teremos vários claros, vários amarelados,
esverdeados, azulados, avermelhados e escuros. Serão quase
infinitas as escalas que poderíamos construir. O que vale dizer, são
quase infinitos também os coloridos. Para nós, homens, apenas
uma fração deles nos é dada à percepção.

O pensamento plástico

            Falamos anteriormente de um pensamento plástico. Podemos
constatar um conflito entre o discurso verbal e a percepção
visual. O filósofo Mário Guerreiro indaga se “devemos concordar
com a ideia de que o percebido só se faz passando pelo crivo da
nomeação, como se a linguagem estivesse filtrando a percepção,
canalizando-a no sentido de só poder captar certos padrões em
detrimento de outros.” Digo que o pintor tem que lidar com as
duas abordagens das cores. Mas, pensando plasticamente, não faz
sentido a nomeação. Por exemplo, um terra de sombra queimada,
um vermelho de cádmio claro, um magenta, um castanho, um rosa
claro são todos avermelhados. E, assim, plasticamente os diversos
azulados, amarelados e esverdeados e os claros e escuros, as cores
simples de Leonardo além dos brancos e pretos.

            Se observarmos, lado a lado, dois vermelhos e dois verdes,
notaremos, tanto nos primeiros como nos segundos, desvios para
os amarelados ou azulados. Se repetirmos a experiência com dois
amarelos e dois azuis, notaremos que ambos os pares se desviam
para os avermelhados ou esverdeados. Dessa forma não mais precisamos
nomear as cores a partir de seus específicos matizes. Um
magenta será para nós um vermelho-azulado, um terra de sena
queimada, um vermelho-amarelado. E o mesmo para os diversos
amarelos ou azulados. Nossa percepção ficará, se livre das nomeações,
mais aguçada. Para fins práticos podemos construir um
diagrama em quadrantes a partir dessas simples percepções que
poderão representar vários coloridos. Abole-se, portanto, um círculo
cromático absoluto, ficamos mais livres para observarmos as
sutilezas cromáticas de Cézanne e notamos sua singularidade face
a seus contemporâneos.

            Há ainda os contrastes simultâneos. Uma mesma cor pode
ter inumeráveis tonalidades conforme aquelas de suas vizinhas, a
qualidade da luz, os rompimentos contínuos, etc. Assim poderemos
dizer que, plasticamente, temos os claros, os escuros, os avermelhados,
os esverdeados, os amarelados e os azulados – as cores
simples de Leonardo. Claro, um pensamento plástico não elimina
para o pintor o pensamento verbal. Ele tem que saber como lidar
com os dois. E certamente com outros, como o pré-lógico, o táctil,
o auditivo, o mágico, etc.

Nomes

            Um trecho de uma crônica de Manuel Antônio de Almeida,
denominada “Nome”, pode nos propor algumas reflexões, por isso
transcrevo-o.

“Dizem os gramáticos, gente detestável nestes tempos de
discordâncias, que o nome é uma voz com que se dá a
conhecer as coisas. Quando nos tempos de colégio minha
memória, rebelde às exigências do decurião, recusava
guardar no seu arquivo esta triste definição, é que meu
espírito, agora o conheço, pressentia-lhe já todo o absurdo
e falsidade. Nunca em verdade uma mentira tão grande se
escreveu em letra redonda.
Aquilo que as coisas menos se dão a conhecer é pelo seu
nome. O nome é hoje, e não sei se o deixou de ser em
algum tempo, a primeira mentira de todas as coisas: é
como o cunho do pecado original impresso sobre tudo
que existe. A tradição da torre de Babel parece-me errada
até certo ponto; o que ali se confundiu não foram as
línguas, foram os nomes das coisas.”

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