segunda-feira, 6 de junho de 2016

Crises do séculos XIX ai XXI e a arte - O espaço plástico em Cézanne - Magritte e Duchamp

Breves anotações

“Fuja de estudar com aquele que produz uma obra destinada a morrer com ele”
“Triste o discípulo é aquele que não ultrapassa seu mestre”
Leonardo da Vinci

A crise do século XIX


Com a industrialização várias crises surgiram: a luta de classes, por exemplo, a neocolonização da África, problemas econômicos, desemprego, concentração de renda e a consequente desigualdade social, etc. A arte as percebeu. Surgiram escritores como Charles Dickens e artistas como Coubert, Daumier, os impressionista, uns mostrando o dia a dia dos menos favorecidos (Daumier, ver figura 1) e esses últimos, os impressionistas, saindo do atelier para pintar ao ar livre. Têm aqueles que saíram de Paris; Van Gogh, admirador de Millet que introduz o espressionismo, Gauguin que se interessa pela arte primitiva do Taiti que depois vai influenciar Picasso, e Cézanne que cria as bases da arte moderna. A arte para dar conta dessas crises, teve que pensar em um espaço plástico aqui, no espaço imediato, e não mais lá. E se lá, como muitos pintores continuaram a fazê-lo, mas que mostrasse, com novas ideias, as diversas faces dessas crises.

Alberti, considerando uma visão monocular, pensa no espaço plástico sendo o suporte a base de uma pirâmide e seu vértice, um ponto para o qual o olho de dirige além dessa base, portanto, lá. Leonardo ao estudar os limites dos corpos, passa a considerar uma visão bi ocular na medida em que esses limites não se definem mais como uma linha com um valor absoluto.






No Tratado da Pintura Leonardo da Vinci diz que “devemos observar com muito cuidado os limites de qualquer corpo para julgar se suas voltas participam de curvaturas circulares e concavidades angulares.” (ver figuras 2, 3, e 4)

Fig 2

Fig. 3

Fig. 4
Apesar dessa visão bi ocular, o espaço plástico vinciano permaneceu ocorrendo lá, além do plano do suporte.
Na época de Leonardo não havia termos específicos para texto sobre teoria da pintura. Michel Ângelo referia-se às superfícies de suas obras como ‘no finitas’. Leonardo da Vinci se refere aos serpenteamentos circulares e angulares. O termo serpenteamento hoje poderia ser definido como o deslocamento de um ponto que geraria uma linha potencialmente ativa e sempiterna. Um objeto quando visto seria circular na medida em que giraria em torno de seu eixo. Simultaneamente as concavidades angulares referiam-se a um espaço plástico além do objeto e que dariam a noção de profundidade. Essa frase de Leonardo da Vinci se relaciona, também, à construção de um espaço plástico. Curioso é lembrarmo-nos de uma frase de Cézanne: “Os objetos no espaço são todos convexos, as horizontais dariam a extensão e as verticais, a profundidade.” Tanto Leonardo como Cézanne estudaram uma perspectiva além da monocular proposta por Alberti.
Caravaggio, que abole a visão bi ocular, dá início a um espaço que enfatiza o plano do suporte, portando um espaço plástico ali, no plano do suporte. (Ver figura 5)

                                Fig 5 - Caravaggio

Voltemos a Leonardo. Diz ele no Tratado da pintura que quando o pintor transpõe algo da natureza para o suporte mata a pintura pela primeira vez e cabe ao pintor evitar uma segunda morte, e isso ele consegue considerando o serpenteamento que anima o espaço plástico. Vale então, considerando o que estamos querendo mostrar, vermos o famoso quadro de Magritte. (Ver figura 6)

                                 Fig. 6 - Magrite

Creio que, considerando o que acima escrevemos, podemos dizer que Magritte está matando a pintura por uma segunda vez ao recusar um espaço plástico lá, ali ou aqui. Ou, dialeticamente, nos mostrando a inutilidade de um esse espaço plástico lá para uma arte de seu tempo. Poderia ter escrito. Isto não é um espaço plástico. Mas esse quadro, contudo, é coisa mental. Podemos também, por esse quadro, aproximar Magrite e Duchamp, na medida que recusa ocupar o espaço tradicional da pintura.

José Maria Dias da Cruz - Florianópolis - maio de 2016

José Maria Dias da Cruz

Natureza morta - guache sobre papel - 74 x 84 cm - 1967

Luíza Chrisóstomo




Um breve comentário.
Primeiro; digo que há a cor concrete adjetiva, que se rompe, que permite o cinza sempiterno, cuja condição é ser no colorido; e há a cor abstrata substantiva, uma ideia platônica que subsiste por si só. Nem uma nem outra tem valores absolutos e o pintor lida com as duas.
No seu quadro em (ver figura 1) o preto, ou vários escuros, que são pintados, é mais abstrato e por contraste valoriza o colorido dando-lhe luminosidade. E esse preto não contorna nenhuma figuração. Conceitualmente podemos dizer que você lida como permanente (o preto ou escuros) e o transitório (o colorido), ou com uma ausência (de uma figuração) e uma presença (do colorido).


Fig. 1 – Luíza Chrisóstomo
Repare que Cézanne deixa o branco da tela não pintado para também, por contrastes, valorizar o colorido (Ver fig 2) . 
 Fig. 2 - Céanne
Não conheço nenhum artista trabalhando o espaço plástico como você o faz. Parabéns por essa criatividade que pode ter muitos desdobramentos.
José Maria Dias de Cruz – Florianópolis, junho de 2016