Parece-me que uma crise na
pintura que eclodiu a partir da década de sessenta do século XX e os discursos
sobre sua morte recalcaram ainda mais a questão da cor. Claro, isso não impediu
que grandes artistas com novas ideias surgissem, como acima anotamos.
Estou imaginando a possibilidade de se pensar em uma geometria das cores. E
digo que essa geometria sou eu, pois a cor é um fenômeno subjetivo. Mas assim
como Cézanne, me sinto como um primitivo pelas coisas novas que descobri.
Muitas são ainda as dúvidas.
Vejamos, agora, como essas questões se desdobraram
nas obras de alguns artistas modernos e contemporâneos.
Certamente Hélio Oiticica percebeu o impasse a que
chegara a pintura ao insistir na utilização de uma teoria cromática baseada no
círculo cromático pós-newtoniano. Afirmou que havia um problema importante na
pintura contemporânea, a cor. Penso que ele, ao afirmar o fim da pintura de
cavalete, não estava endossando o que muitos artistas e críticos afirmavam: a
morte da pintura. Penso que condenava as pinturas realizadas no espaço remoto.
Disse que a era da pintura de cavalete estava definitivamente encerrada. Hélio Oiticica pensou no núcleo da cor, em sua
dimensão temporal e espacializou a pintura ao realizar os relevos e os parangolés.
Pergunto-me: não estaria também esse artista seguindo Cézanne, que nos mostrou
um espaço da pintura coincidindo com esse no qual nos orientamos? Lida menos
com o conceito da cor abstrata substantiva e enfatiza mais a concreta adjetiva,
muito embora ainda não as diferenciasse. E mais ainda: estará nos apontando
para repensar o que Leonardo da Vinci nos diz sobre o serpenteamento e uma
visão bi ocular, e como o pintor deve
evitar a segunda morte da pintura?
Com a industrialização várias crises surgiram: a
luta de classes, por exemplo, a neocolonização da África, problemas econômicos,
desemprego, concentração de renda e a consequente desigualdade social, etc. A
arte as percebeu. Surgiram escritores como Charles Dickens, Vitor Hugo e
artistas como Coubert, Daumier, os impressionistas,
uns mostrando o dia a dia dos menos favorecidos e esses últimos, os
impressionistas, saindo do atelier para pintar ao ar livre. Têm aqueles que
saíram de Paris; Van Gogh, admirador de Millet que introduz o expressionismo;
Gauguin que se interessa pela arte primitiva do Taiti que depois vai
influenciar Picasso; e Cézanne que cria as bases da arte moderna. A arte, para
dar conta dessas crises, teve que pensar em um espaço plástico aqui, no espaço
imediato, e não mais lá, no espaço remoto, ou ali, na superfície do suporte. E
se lá, no espaço remoto, ou ali, na superfície do suporte, como muitos pintores
continuaram a fazê-lo, passa mostrar, com novas ideias, as diversas faces
dessas crises.
Daumier
Se observarmos os quadros de Cézanne, e citarmos
algumas de suas frases (Seguem abaixo), ou seja, partirmos das fontes primárias,
, poderemos afirmar que ele criou outra teoria das cores.
"Quanto mais as cores se
harmonizam, mas as formas se precisam".
“Na natureza tudo está colorido.”
Cézanne encerra a discussão entre desenhistas e
coloristas. Creio que podemos dizer que no pictórico, ou em um colorido, as
cores são concretas adjetivas e as formas a elas ficam subordinadas, e no
gráfico as cores abstratas substantivas ficam subordinadas às formas.
"A luz não existe para o
pintor, tem que ser substituída por outra coisa, a cor".
Seguindo o mestre de Aix e observando as cores
simples de Leonardo da Vinci e considerando o conflito entre a percepção
sensível e a linguagem, e por extensão as cores concretas, descartei o círculo
cromático iluminista. Segue uma assemblage.
Outra frase de Cézanne. "Somente um cinza reina na natureza e alcançá-lo é de
uma dificuldade espantosa". Segue uma
assemblage:
Cézanne afirmou que somente um cinza reina na
natureza. Rilke em suas cartas sobre Cézanne disse que esse cinza não existe,
mas que se manifesta no quadro e dele surgem as cores.
Denomino o cinza intuído com conhecimento plástico
pelo mestre de Aix como sempiterno.
Um tom considerado como cor concreta adjetiva se
rompe, objetivamente, quando sobre ele se sobrepõe sua oposta, sua pós-imagem.
Não é, como muitos teóricos afirmam, um problema de misturas pigmentares, ou
seja, um pintura retiniana denunciada por Duchamp. Temos então uma distância entre
a cor e sua oposta e a passagem entre elas é um ponto. Diremos, então, que esse
ponto, que não possui nenhuma dimensão, não é mais aquele definido pela
geometria euclidiana, é um não espaço, um não tempo, mas com uma potência. Como
todas as cores se rompem, o cinza onipresente contém todas elas, ou seja, todos
os coloridos, e assim este cinza é causa e efeito de todas as cores e
coloridos. Como na natureza tudo está colorido, o cinza onipresente nela se
manifesta como um pré ou pós-fenômeno.
Mas não percebemos todos os coloridos, esses nos são
interditados. Daí entendermos porque Cézanne dizia que só pinta uma fração do
espaço. Cada colorido, então, terá seu exclusivo cinza sempiterno e com a mesma
lógica do cinza onipresente, ou seja, ambos são causa de si mesmo. E há ainda a
questão de jamais sabermos quando uma cor é ela mesma. Podemos pensar na
geometria dos fractais e na topologia. E mais ainda, o colorido com uma
dimensão metafísica e ontológica, estas agora enriquecidas com as novas
descobertas da física quântica.
Outras frases: "Entre
o objeto e o pintor se interpõe um plano, a atmosfera. A natureza é mais em
profundidades que em superfície".
Segue uma assemblage.
Segue uma assemblage.