quinta-feira, 4 de julho de 2013

Nenhuma forma de arte surge a partir do nada; surge sempre a partir de “algo”.


Nenhuma forma de arte surge a partir do nada; surge sempre a partir de “algo”.


No tempo presente do mundo que se convencionou chamar ocidental, a busca criativa, do jeito que a conheço, descreve um ocaso, indica uma busca que prenuncia intuições sobre algum equívoco básico. Uma luz que se apaga, ruínas, mortalidade terrena, escuridões, desbotamentos, desfigurações, fascinação pelo fim, a imagem contemporânea é poente. Nessa perspectiva, emblemático é o percurso de Anselm Kiefer: o trabalho do artista revela um empenho, ora implícito, ora explícito, para conter a entropia que penetra toda forma viva. De um embate como esse é que a produção das artes deriva seu poder criativo e sua tensão não-resolvida, considerando-se que o espírito do nosso tempo aparece marcado por uma exaustão essencial. Assim é e tanto que a muitos artistas restou o re-contar, estabelecendo um virtuoso inventário do existente, ainda que sob rótulos inéditos.


Felizmente, pela graça concedida a alguns, persistente é o contra-pulso da criação. Em muito bem vindas ocasiões, o espelho que reflete a presença da condição humana é um espelho capaz de manifestar, singularmente, suas imagens. Pois uma revolta contra o mundo tal como se apresenta surge vital: é o que se viu e o que se vê na pluralidade de tentativas, algumas excepcionais, muitas prescindíveis, ocorrendo no ofício do artista. Tudo em nome de enfrentar esse vácuo feroz que, onipresente, poderia anular a criação. Reiterando: é de tensão e luta o vínculo entre o verdadeiro artista e sua obra – gestos de incerteza, de veneração; movimentos da dor, do dilaceramento, do êxtase; figuras pictóricas ambíguas; momentos trágicos, sublimes; a queda paradoxal nos abismos lúcidos da consciência. Pelas forças que cavam, escavam fundo e ao mesmo tempo, o primitivo e o eterno. Por um sentimento de mundo propiciado pela ligação estética entre o íntimo e o imenso.


Denise Stucchi – Doutora em Educação, Arte e Linguagem pela Universidade Estadual de Campinas – SP.

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