sábado, 11 de fevereiro de 2017

As vinhas da ira - livro do escritor norte-americano John Steinbeck, publicado em 1939.

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As vinhas da ira - livro do escritor norte-americano John Steinbeck, publicado em 1939.
A narrativa acompanha a família Joad, que se vê obrigada a abandonar a terra na qual viveu e produziu em função de máquinas que tornam obsoleto o seu trabalho: o trator. Estimulados por folhetos que prometiam trabalho e bem-aventurança no sul dos Estados Unidos da América, partem para lá.
O romance retrata a crueldade do sistema que levou milhares de famílias a buscar a sorte onde ela não existia.
As coisas por que passam cada membro da família Joad, e os que a eles se associam nessa trajetória desumana, são contadas com uma sensibilidade e uma crueza que raramente se encontram associadas em narrativas de qualquer gênero. O final é magistral nesse sentido. Neles estão juntas a esperança nos seres humanos e o desespero da situação por eles vivida. É dolorosamente lindo, pungente, visceral!
No decorrer da trajetória da família Joad, o narrador, em vários momentos, interrompe a narrativa com digressões arrepiantes pelas verdades com que “esbofeteiam” o leitor.
A mais bela delas, na minha opinião, está no começo do capítulo XIII, que reproduzo a seguir:
“Inquietavam-se as terras do oeste sob os efeitos da metamorfose incipiente. Os Estados ocidentais estavam inquietos como cavalos antes do temporal. Os grandes proprietários inquietavam-se, pressentindo a metamorfose e sem atinar com a sua natureza. Os grandes proprietários atacavam o que lhes ficava mais próximo: o governo de poder crescente, a unidade trabalhista cada vez mais firme; atacavam os novos impostos e os novos planos, ignorando que tudo isso era efeito, e não causa. Efeito, não causa; efeito, não causa. A causa escondia-se bem no fundo e era simples – a causa era a fome, barriga vazia, multiplicada em milhões; fome na alma, fome de um pouco de prazer e um pouco de tranquilidade, multiplicada em milhões; músculos e cérebros, que querem crescer, trabalhar, criar, multiplicado em milhões. A última função clara e definitiva do homem – músculos que querem trabalhar, cérebro que quer dominar o simples desejo – isto é um homem. Construir um muro, construir uma casa, um dique, e botar nesse muro, nessa casa, nesse dique algo do homem, e retirar para o homem algo desse muro, dessa casa, desse dique; obter músculos duros à força de movê-los, obter linhas e formas elegantes pela concepção. Porque o homem, mais do que qualquer coisa orgânica ou inorgânica no universo, cresce à força de seu próprio trabalho, galga os degraus de suas próprias ideias, emerge à força de suas próprias habilitações. É isto o que se pode dizer do homem; quando teorias mudam e caem por terra, quando escolas filosóficas, quando caminhos estreito e obscuros das concepções nacionais, religiosas, econômicas alargam-se e se desintegram, o homem se arrasta para a frente, muitas vezes sob o efeito de dores, muitas vezes inutilmente. Tendo dado um passo à frente, pode voltar atrás, mas não mais do que meio passo, nunca o passo todo que já deu. Isto se pode dizer do homem, dizer-se e saber-se. Isto se pode saber quando bombas caírem dos aviões negros sobre a praça do mercado, quando prisioneiros são tratados como porcos imundos, quando corpos crivados de balas rolarem na poeira. Aí, então, pode-se saber isto. Não tivesse sido dado esse passo, não estivesse vivo no cérebro o desejo de avançar sempre, essas bombas jamais cairiam e nenhum pescoço seria jamais cortado. Tenha-se medo de quando as bombas não mais caem, enquanto os bombardeiros estão vivos, pois que cada bomba é uma demonstração de que o espírito não morreu ainda. E tenha-se medo de quando as greves cessam, enquanto os grandes proprietários estão vivos, pois que cada greve vencida é uma prova de que um passo está sendo dado. E isto se pode saber – tenha-se medo da hora em que o homem não mais queira sofrer e morrer por um ideal, pois que esta é a qualidade-base da Humanidade, é a que o distingue entre tudo no universo.”
Maria Clara Dias da Cruz

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