sexta-feira, 27 de junho de 2014

Trecho do ensaio “A poesia e o livre mercado” do poeta mexicano Octavio Paz,

Trecho do ensaio “A poesia e o livre mercado” do poeta mexicano Octavio Paz,

Desde a era do romantismo, os leitores de poemas têm sido figuras solitárias e dissidentes, assim como os próprios poetas, aliás. São poetas e leitores burgueses, sim, mas revoltados contra seu passado, sua classe social e a ética do mundo.

Com exceção de meia dúzia aristocratas, todos os poetas modernos pertenceram e pertencem à classe média. Todos eles cursaram faculdade. Alguns foram advogados, jornalistas, médicos, professores e diplomatas, outros foram executivos de publicidade ou relações públicas, banqueiros, empresários, burocratas importantes. Alguns poucos, como Verlaine e Rimbaud, foram parasitas.

Estamos vivendo uma mudança dos tempos: não uma revolução, no sentido mais profundo e duradouro da palavra, uma revolta – uma volta à origem, um retorno ao início. Estamos testemunhando não o fim da história, como afirmou um certo professor universitário nos Estados Unidos, mas um reinício.

Hoje em dia a literatura e as artes estão expostas a um perigo diferente: estão sendo ameaçadas não por uma doutrina ou período político mas por um processo econômico sem rosto, sem alma e sem direção. O mercado é circular, impessoal, inflexível. Alguns me dirão que está certo, que é assim mesmo que deveria ser. Talvez. Mas o mercado, cego e surdo, não aprecia riscos, não sabe como escolher.

Num mundo governado pela lógica do mercado, ou pelo planejamento estatal nos países comunistas, a poesia é uma atividade que não traz retorno algum. Seus produtos são praticamente e quase inteiramente inúteis. Para a mente moderna, embora ela não não admita isto para si própria, a poesia é energia, tempo e talento voltados a objetos supérfluos. No entanto, contrariando toda a lógica, a poesia circula e é lida. Rejeitando o mercado, custando quase nada, ela passa de boca a boca, como o ar e a água. Seu valor e sua utilidade não podem ser medidos; um homem rico em poesia pode ser um mendigo. E os poemas não podem ser economizados para formar uma poupança para firmar uma poupança: eles têm q ser gastos.

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