José Maria Dias da Cruz é continuidade, daí sua frase marcante: “O
artista não é um ego, é um eco”. Ela serve tanto para descrever seu trabalho e
sua pesquisa artística quanto para descrever sua personalidade.
Seus livros refletem sua
obra de maneira paradoxalmente assertiva. É necessário dizer isto, pois o
próprio frisa aos seus discípulos que para se compreender o pensamento plástico
é preciso distinguir a percepção sensível da linguagem verbal. Ora, Zé consegue
transitar entre os dois. Ele sempre relembra que é preciso recorrer às fontes
primárias, sejam elas imagens ou textos. Assim como Cézanne enunciou que
desejava refazer Poussin diretamente da natureza, ele tem como fim tornar
acessível toda sabedoria da enigmática e secular tradição colorista.
O trajeto desta geometria
das cores, desde Leonardo, passando por Ticiano, Poussin, Cézanne, Braque,
Oiticica etc... está na contemporaneidade em suas mãos e nas daqueles que tem a
dádiva de estudar o pensamento de pintura tão cuidadosamente amarrado por ele.
Certa vez, em uma conversa antes de sua aula, disse-me que não pretendia formar
um bando de “Zé-Mariazinhos” e sim que cada um de seus alunos tivesse contato
com o universo das cores e dali fazer o suco que quiser. Isto lembra muito
Cézanne ao afirmar que “pretendia criar uma tradição e não uma escola” ou
Braque ao afirmar que “ O eco responde ao eco, tudo se repercute.” É
interessante ver a força de um pensamento que não obedece a doutrina iluminista
da razão nos dias de hoje. Aquela necessidade típica do século XVIII se
refletiu no estudo das cores, resultando no círculo cromático tradicional o que
na prática suprimiu os estudos do olhar realizado pelos pintores coloristas. A
cor ficou, então, subordinada à forma quando, na verdade, nenhuma das duas
reina absoluta, vivem em um grande bailado diante de nossas retinas.
Aliás, quem reina absoluto
na natureza é só o cinza sempiterno que para Cézanne era de uma dificuldade
espantosa de se obter. É um ponto potencial de onde as cores divergem e para
onde convergem, sendo causa e efeito dos coloridos. Isso fez Zé ir ao encontro
dos estudos de Espinosa que em seus Axiomas filosofa neste sentido ao abordar
Deus como a Natureza. Ética e Estética viram um só.
Voltando a questão de sua personalidade, ser
um eco representa toda sua humildade e sua generosidade. Diz que tem muito o
que aprender, mas nunca se nega a ensinar tudo que sabe. Durante um exercício,
em uma de suas aulas no Parque Lage, em que estou recebendo o privilégio de ser
seu assistente, ainda acostumando-me a receber perguntas sobre o rompimento do
tom, oposição cromática etc... Uma aluna se vira e me pergunta: “Como faço para
ter o Zé na minha família?” - Em tom de brincadeira, respondi rápido: Seilá, pede
ele em casamento! Após nossas breves risadas, perguntei ao aluno sentado do
lado oposto da mesa que ouvira o diálogo como eu poderia respondê-la e ele me
deu uma bela solução retirada de “O Pequeno Príncipe”, de Antoine de
Saint-Exupéry: Tu te tornas eternamente responsável pelo que cativas!”
Se Cézanne disse que Arte é
religião, pode-se dizer que nosso Zé é mais que um mestre, é nosso guru.
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