sábado, 2 de março de 2013

José Maria Dias da Cruz - Vórtice - óleo sobre tela - 110x140cm - 2004


Palestra sobre Cézanne



Palestra sobre Cézanne

A palestra será dividida em 3 partes.

A primeira. Falaremos da dificuldade de interpretá-lo. Cézanne pouco escreveu e, deixando Paris para se retirar em Aix em Provence, pouco falou. Dizia sempre que preferia  pintar. Algumas de suas frases: “Les causeries sur l’art sont presque inutile.” (O blá blá blá sobre arte é quase inútil.) Mas isso não implica que Cézanne não se importava com questões teóricas. Ao contrário. Outras frases. “A pintura é teoria aplicada diretamente em contato com a natureza.” “Não basta ver, faz falta a reflexão.” Somente próximo de seu fim, foi procurado por outros artistas, críticos e marchands. Um dos mais assíduos freqüentadores do atelier de Cézanne foi Émile Bernard. E desse encontro um equivoco surgiu. A inclusão do cubo nas reflexões de Cézanne e que fez fortuna nos movimentos dos primórdios da arte moderna no princípio do século XX.

A interpretação de Argan.

A Teoria do não Objetos de Ferreira Gullar.

A segunda. Cézanne como pintor. Tentaremos mostrar como rompeu com os impressionistas. Como desprezou uma teoria cromática baseada em um círculo cromático absoluto que classifica as cores em primárias e secundárias. Veremos seu respeito às observações de Pissarro, que muito marcaram o pensamento cezanneano. Tentaremos falar um pouco do que afirmou a Émile Bernard. “Vou lhe dizer o que é a verdade em pintura.” Nunca disse, mas pintou, e se rastrearmos os artistas que o influenciaram (Poussin, Chardin, Delacroix e Manet), podemos desvelar algo.

Análise de uma quadro de Chardin.

Nesta segunda parte falaremos ainda sobre a possibilidade de repensarmos as questões cromáticas descartando uma teoria que considera o círculo cromático absoluto. Afirmou: “A luz não existe para o pintor, tem que substituída por uma outra coisa, a cor. Fiquei contente comigo mesmo quando descobri isso.” Descartou, portanto, uma teoria cromática que se baseou no espectro. Que teoria desenvolveu? Procuraremos entende-lo. Referia-se ainda a um cinza que reina em toda natureza dificílimo de alcançar. Tentaremos definir o cinza sempiterno, como passei a denominar esse cinza a que Cézanne se referia. E mais, o rompimento do tom, a cor abstrata substantiva, a cor concreta adjetiva, o serpenteamento vinciano, etc. Mostraremos que em importantes livros sobre a teoria das cores Cézanne nem é citado ao contrário de Seurat. (A historia das cores, de Manlio Brusantin; O espiritual na arte; de Kandinsky; Teoria da arte moderna, de Klee; Interação das cores, de Albers; Teoria das cores, de Itten; nos escritos de Hélio Oiticica e muitos outros). Quando é citado, pouco de suas preocupações cromáticas são abordadas. E até mesmo em livros de divulgação científica Cézanne é citado, ao contrário de Seurat. Mas Cézanne estava bem consciente de suas descobertas. Afirmou: “Sou um primitivo pelas coisas novas que descobri.”

Nesta parte tentaremos apontar para um dos possíveis desdobramentos das suas descobertas: uma geometria das cores.

Na terceira parte falaremos de Cézanne como desenhista. Penso que o mestre conseguiu apontar para uma autonomia do desenho, o que vale dizer, do desenho livre das amarras históricas pelas quais, como escreveu Vasari, era considerado. Falava-se do desenho como o pai das três artes: a pintura, a escultura e a arquitetura. Nessa parte voltaremos a Leonardo e seu conceito de serpenteamento. É uma frase difícil de compreender em sua totalidade. “Devemos considerar com muito cuidado os limites de qualquer corpo e o modo como serpenteiam, para julgar se suas voltas participam de curvaturas circulares ou concavidades angulares”. Merleau-Ponty faz uma referência a essa frase e cita Ravaison e Bergson. Estes entendem que o serpentaemento somente se explicaria considerando os seres vivos, e como um eixo gerador. Pensamos que Leonardo nos indica um outro conceito de linha. Uma linha potencialmente ativa.

Terminarei a exposição com uma pergunta a qual não responderei. O que será que Cézanne quis dizer quando afirmou: “As cores são quase umas mônadas.” Será que não está nessa afirmação uma referência ao cinza sempiterno?

Impressões de um pintor sobre poemas de Elaine Pauvolid



Elaine Pauvolid 

É possível que seu navegador não suporte a exibição desta imagem.Impressões de um pintor sobre poemas de Elaine Pauvolid
*José Maria Dias da Cruz
A palavra imediata tudo vela, além do que indica, ou quase, para impor seu poder. Se não ficarmos atentos acreditamo-la absoluta. Assim, não merece toda nossa confiança. A palavra imediata perde seu poder quando dela surge a palavra remota.
Cito, aqui, três pensamentos do pintor George Braque: "a sobrevivência não apaga a lembrança". "O futuro é a projeção do passado condenada pelo presente". "Os que se apóiam sobre o passado para profetizar fingem ignorar que o passado é senão uma hipótese".
Por estes pensamentos adentramos nos seguintes versos de Elaine:
As melhores dicas virão depois.
Esteja certo disso.
Há o desafio de anularmos o poder das palavras imediatas e a desconfiança que delas temos. Há uma reflexão sobre o tempo. A palavra depois se torna menos imediata que remota. Uma luz de esperança surge. Se há um futuro, há um presente escondido e inseguro. A certeza do presente não resolve a dúvida da verdade. A certeza fica em suspenso.
Entrelaçada à palavra imediata há a palavra remota. Um entrelaçamento simétrico e simultâneo nos revela vários níveis de realidade e percepção em diversos tempos e direções. É deste entrelaçamento que advém um raio poético. A palavra remota tenciona a imediata, esvazia seu poder. Não podemos mais estabelecer o lugar de cada uma em termos absolutos. Há as diversas distâncias entre elas.
São poemas que tenho a lhe dizer.
Espero que me compreenda.
Ou se não me compreender
espero apenas
um poema incompreendido por você
A palavra imediata e a palavra remota trazem em si uma contradição. Um discurso linear e unidimensional se contrapõe a outro, não linear e multidimensional. Uma nova mentalidade se desenha. A flecha do tempo e da informação anula a contradição e nos revela outros níveis de realidade e percepção.
A palavra imediata, quando quase tudo domina, pode obstruir caminhos e sonhos. Assim sendo, deixa intacta uma simples relação sujeito-objeto. Mas, a poeta nos alerta. Podemos estabelecer com o poema uma relação quase mágica.
No espaço esqueço
que sou no tempo.
Num intervalo tento
alcançar a margem,
a sem limites.
Reescrevo-me
para saber-me
escrava fora de alcance.
À medida que avançamos na leitura dos poemas de Elaine sentimos um adensamento. Outras relações se estabelecem. As palavras e os poemas adquirem várias dimensões.
L´espoir de rencontrer
les mots
ou les morts.
Novamente a esperança. E a dúvida. Mas, nada disso resolve o enigma. Ou como diz o filósofo, o enigma é que não há enigma nenhum.
E no silêncio do frio
a voz dela recortava
palavras que eram gotas
em ciranda aberta
no nublado dos sons vãos.
Tarefa difícil. Somos levados pelos poemas de Elaine a mares profundos sem perdermos o horizonte da superfície.
Sussurro palavras mal colocadas.
E não se perceba o que digo,
Ou soe como exagero.
As palavras-conta mal colocadas se espalham em busca de outros lugares, outros tempos. Saem da ordem de um determinado nível de realidade e percepção e procuram se articular em outra instância, dentro de outra ordem com uma lógica inesperada.
Dançam ao chão em desfile triste
as contas que do fio tênue desistem
(...)
à primeira rajada do fero mar,
erguendo não sei qual derrota,
querendo não sei qual rota
O exagero, o desfile triste, a desistência, a derrota, a indeterminada rota são os limites: a vida balizada entre nosso nascimento e morte e um espaço limitado. Além da flecha do tempo, também o tempo da vida. O passado e o futuro orbitando o presente: vida, morte e ressurreição. A ressurreição é a zona de não resistência, a transparência absoluta, o fim das contradições, o sagrado, o enigma, o cinza sempiterno, o ilimitado, o infinito...
conjeturo o infinito
vejo o abandono terrível em que vivo.
Elaine canta o que cantar é possível.
agosto, 2006
José Maria Dias da Cruz - artista plástico, professor da Escola de Artes Visuais do Parque Lage.

sexta-feira, 1 de março de 2013

Delacroix - A Lagosta







Quem vista o Louvre encontra em uma das principais alas alguns quadros de Delacroix, entre eles um bastante citado por historiadores, críticos, etc., o quadro intitulado A Liberdade Guiando o Povo. Mas em outra ala, bem menor, vai se deparar com o quadro A Lagosta, pintura para pintores.