Rembrandt Auto retratos
A Velhice
e a juventude e os auto-retratos de Rembrandt, um trecho de um e-mail de
Antônio Augusto Mariante e um adendo escrito por José Maria Dias da Cruz
Estou
hoje lúcido como se estivesse para morrer
Àlvaro de Campos (Fernando Pessoa)
Àlvaro de Campos (Fernando Pessoa)
Auto retrato de Rembrandt quando jovem
“Pelo
amor de Deus, não se preocupe também com o envelhecimento - é o preço de uma
vida em sua extensão em franco alongamento. Sei que há percalços de natureza
física, mas isso faz parte do próprio movimento da mera natureza das coisas.
Vejo a velhice como o ponto de culminância de um sujeito, onde mente e espírito
atingem o ápice daquela individualidade - entretanto, tal situação só se dá com
criaturas de escol, e pouco importa que sejam até analfabetas, pois o relevante
não é a cultura adquirida, mas a sabedoria alcançada. Adoro uma negra velha bem
sábia, dessas que calejaram suas mãos num tanque e numa cozinha, e se afirmam
quase puras quando a morte as abraça.
Entretanto,
não é bem esse o caso da maioria dos velhos que tenho encontrado pelo caminho
de minha sensibilidade: eles se impõem pelo retrocesso e pela infantilidade,
negando a morte como um bom avestruz ou um tola criança inglesa que se recusa a
emprestar seu teddy bear.
Adoro John
Huston que dirigiu The Death (baseado num conto de Joyce) numa cadeira de rodas
e com uma sonda pavorosa entrando por uma das suas narinas. O filme é chato,
mas a iniciativa dele é sublime.
Portanto,
não se aflija e toque o cavalo no touro! Pinte até o fim! E o resto que se
dane!”
Antônio
Augusto Mariante
A velhice
ontem e hoje
É na
velhice que o homem pode ter uma consciência de sua existência e, assim, saber
se ela, esta existência, foi uma realização plena que lhe permita, então,
perceber que não viveu em vão, que considerou os outros e até mesmo se deixou
um legado. Por outro lado pode, também, até mesmo perceber se sua vida foi
submissa a interesses alheios a sua existência, interesses estes que o levaram
a um individualismo exarcebado, inútil, egoísta e que na maturidade lhes
permitam se rever e se salvar com um olhar de ternura.
Um
exemplo são os auto-retratos de Rembrandt. Um pintado quando ainda jovem. Sua
expressão é altiva, vaidosa, preparada para um destino vencedor. Outro na sua
velhice. Neste a sua expressão já diz tudo. Ficam claras a sua lucidez,
maturidade e sabedoria apesar da trágica derrota e da solidão antes de seu fim.
As palavras tornam-se até inúteis, percebe-se logo quando se vê o auto-retrato
quando velho. Há um olhar que nos vê e se vê.
E hoje,
quando se enaltece tanto a juventude! Por quê?
E o que é
o tempo de uma vida? Há aquela, padronizada, medida pelos anos. Mas há aquela
que pode ser medida também tanto pelas condições físicas dos indivíduos ou como
pelos seus respectivos estados de amadurecimento. Cronos e aión em convivência.
José
Maria Dias da Cruz
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